Tasca da dona Maria em Alpedrinha: uma porta aberta para a fraternidade


A porta está sempre aberta durante o dia. Conheço a dona Maria desde que vou a Alpedrinha, há duas décadas e meia.
A melhor ginjinha da Beira Baixa é ali que se prova e repete. Jovens e idosos passam horas a beber e a conversar naquele espaço.
Há duas semanas, qual não é o meu espanto, a senhora intervém numa conversa de rapazes com uma lucidez e uma sabedoria dignas de registo. Ao escutar da boca de um deles que preferia ser espanhol logo a dona Maria disse com um sorriso maroto que isso devia ser por causa das raparigas e logo a seguir comentou "olha, se dissesses isso no tempo do Salazar ias para a choça (prisão)"
E com uma memória fascinante relatou o dia em que HumbertoDelgado chegou a Alpedrinha para fazer a sua campanha à Presidência da República, em tempos de ditadura feroz. O medo, o silêncio pontuaram esse momento inesquecível. O marido de dona Maria era um homem de esquerda (comunista, dizem) e durante anos ela guardou religiosamente selos dessa campanha, que passado este tempo todo mostrou, colocando-os em cima do balcão.
Não há palavras que possam descrever o espanto e a ternura por esta mulher da Beira, sempre vestida de preto e rija como os fraguedos graníticos da Gardunha.
Bem Haja dona Maria por esta partilha fraterna!
LFM:texto e fotos